segunda-feira, 11 de junho de 2012
A ESCRAVA DO SENHOR
A ESCRAVA DO SENHOR
Quando João, o discípulo amado, veio Ter com Maria, anunciando-lhe a detenção do Mestre,
o coração materno, consternado, recolheu-se ao santuário da prece e rogou ao Senhor
Supremo poupasse o filho querido. Não era Jesus o Embaixador Divino? Não recebera a
notificação dos anjos, quanto à sua condição celeste? Seu filho amado nascera para a
salvação dos oprimidos... Ilustraria o nome de Israel, seria o rei diferente, cheio de amoroso
poder. Curava leprosos, levantava paralíticos sem esperança. A ressurreição de Lázaro, já
sepultado, não bastaria para elevá-lo ao cume da glorificação?
E Maria confiou ao Deus de Misericórdia suas preocupações e súplicas, esperando-lhe a
providência; entretanto, João voltou em horas breves, para dizer-lhe que o Messias fora
encarcerado.
A Mãe Santíssima regressou à oração em silêncio. Em pranto, implorou o favor do Pai
Celestial. Confiaria nEle.
Desejava enfrentar a situação, desassombradamente, procurando as autoridades de
Jerusalém. Mas, humilde e pobre, que conseguiria dos poderosos da Terra? E, acaso, não
contava com a proteção do Céu? Certamente, o Deus de Bondade Infinita, que seu filho
revelara ao mundo, salvá-lo-ia da prisão, restituí-lo-ia à liberdade.
Maria manteve-se vigilante. Afastando-se da casa modesta a que se recolhera, ganhou a rua
e intentou penetrar o cárcere; todavia, não conseguiu comover o coração dos guardas.
Noite alta, velava, súplice, entre a angústia e a confiança.
Mais tarde, João voltou, comunicando-lhe as novas dificuldades surgidas. O Mestre fora
acusado pelos sacerdotes. Estava sozinho. E Pilatos, o administrador romano, hesitando
entre os dispositivos da lei e as exigências do povo, enviara o Mestre à consideração de
Herodes.
Maria não pôde conter-se. Segui-lo-ia de perto.
Resoluta, abrigou-se num manto discreto e tornou à via Pública, multiplicando as rogativas
ao Céu, em sua maternal aflição. Naturalmente, Deus modificaria os acontecimentos,
tocando a alma de Antipas. Não duvidaria um instante. Que fizera seu filho para receber
afrontas? Não reverenciava a lei? Não espalhava sublimes consolações? Amparada pela
convertida de Magdala, alcançou as vizinhanças do palácio do tretarca. Oh! Infinita
amargura! Jesus fora vestido com uma túnica de ironia e ostentava, nas mãos, uma cana
suja à maneira de cetro e, como se isso não bastasse, fora também coroado de libertar-lhe a
fronte sangrenta e arrebatá-lo da situação dolorosa, mas o filho, sereno e resignado,
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endereçou-lhe o olhar mais significativo de toda a existência. Compreendeu que ele a induzia
à oração e, em silêncio, lhe pedia confiança no Pai. Conteve-se, mas o seguiu em pranto,
rogando a intervenção divina. Impossível que o Pai não se manifestasse. Não era seu filho o
escolhido para a salvação? Lembrou-lhe a infância, amparada pelos anjos... Guardava a
impressão de que a Estrela Brilhante, que lhe anunciara o nascimento, ainda resplandecia no
alto!...
A multidão estacou, de súbito. Interrompera-se a marcha para que o governador romano se
pronunciasse em definitivo.
Maria confiava. Quem sabe chegara o instante da ordem de Deus? O Supremo Senhor
poderia inspirar diretamente o juiz da causa.
Após ansiedades longas, Pôncio Pilatos, num esforço extremo para salvar o acusado,
convidou a turba farisaica a escolher este Jesus, o Divino Benfeitor, e Barrabás, o bandido. O
povo ia falar e o povo devia muitas benções ao seu filho querido. Como equiparar o
Mensageiro do Pai ao malfeitor cruel que todos conheciam? A multidão, porém, manifestouse,
pedindo a liberdade para Barrabás e a crucificação para Jesus. Oh! - pensou a mãe
atormentada - onde está o Eterno que não me ouve as orações? Onde permanecem os anjos
que me falavam em luminosas promessas?
Em copioso pranto, viu seu filho vergado ao peso da cruz. Ele caminhava com dificuldade,
corpo trêmulo pelas vergastadas recebidas e, obedecendo ao instinto natural, Maria avançou
para oferecer-lhe auxílio. Contiveram-na, todavia, os soldados que rodeavam o Condenado
Divino.
Angustiada, recordou-se repentinamente de Abraão. O generoso patriarca, noutro tempo,
movido pela voz de Deus, conduzira o filho amado ao sacrifício. Seguira Isaac inocente,
dilacerado de dor atendendo a recomendação de Jeová, mas, eis que no instante derradeiro,
o Senhor determinou o contrário, e o pai de Israel regressara ao santuário doméstico em
soberano triunfo. Certamente, o Deus Compassivo escutava-lhe as súplicas e reservava-lhe
júbilo igual. Jesus desceria do Calvário, vitorioso, para o seu amor, continuando no
apostolado da redenção; no entanto, dolorosamente surpreendida, viu-o içado no madeiro,
entre ladrões.
Oh! A terrível angústia daquela hora!! ... Por que não a ouvira o Poderoso Pai?? Que fizera
para não lhe merecer a benção?
Desalentada, ferida, ouvia a voz do filho, recomendando-a aos cuidados de João, o
companheiro fiel. Registrou-lhe, humilhada, as palavras derradeiras. Mas, quando a sublime
cabeça pendeu inerte, Maria recordou a visita do anjo, antes do Natal Divino. Em retrospecto
maravilhoso, escutou-lhe a saudação celestial. Misteriosa força assenhoreava-se-lhe do
espírito.
Sim... Jesus era seu filho, todavia, antes de tudo, era o Mensageiro de Deus. Ela possuía
desejos humanos, mas o Supremo Senhor guardava eternos e insondáveis desígnios. O
carinho materno poderia sofrer, contudo, a Vontade Celeste regozijava-se. Poderia haver
lágrimas em seus olhos, mas brilhariam festas de vitória no Reino de Deus. Suplicara
aparentemente em vão, porquanto, certo, o Todo-Poderoso atendera-lhe os rogos, não
segundo os seus anseios de mãe e sim de acordo com seu planos divinos.
Foi então que, Maria, compreendendo a perfeição, a misericórdia e justiça da Vontade do
Pai, ajoelhou-se aos pés da cruz e, contemplando o filho morto, repetiu as inesquecíveis
afirmações: - "Senhor, eis aqui a tua serva! Cumpra-se em mim, segundo a tua palavra!".
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